10 março 2025
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O Poder do Dinheiro na Origem da Filosofia: Uma Teoria Surpreendente

O livro “Trabalho Intelectual e Manual” do filósofo Alfred Sohn-Rethel propõe uma tese intrigante, afirmando que o pensamento abstrato, essencial à filosofia, matemática e ciências, originou-se da prática do uso do dinheiro. A moeda, empregada nas transações comerciais, teria proporcionado à racionalidade a capacidade de formular abstrações, permitindo posteriormente a construção de conceitos e teorias.

A obra inicia-se com a ideia de que as habilidades racionais não são inatas, mas desenvolvidas ao longo da história através da experiência. Para que o ser humano pudesse aprender a pensar de forma abstrata, era necessário que uma forma de abstração já existisse na realidade concreta, a qual pudesse ser percebida e assimilada. Este conceito pode parecer paradoxal — algo que é simultaneamente abstrato e material. No entanto, essa dualidade é representada pelo dinheiro.

Por exemplo, uma nota de dez reais, embora um objeto físico fabricado em papel e sujeito a desgaste, mantém seu valor inalterado independentemente de suas condições materiais. O dinheiro é, portanto, um bem tangível que incorpora um valor que é, em si, uma abstração fixa e imutável. Desde a sua criação, o dinheiro passou a representar um objeto que carrega a abstração do valor.

O valor presente no dinheiro é descrito por Sohn-Rethel como a primeira abstração que se tornou evidente para a humanidade, influenciando o pensamento. Esta abstração emergiu da prática de troca de mercadorias, onde os valores começaram a ser percebidos, independentemente das diferenças reais entre os bens. Em uma transação, por exemplo, quando se troca peixes por porcos, é apenas o valor que é considerado, desconsiderando as especificidades dos produtos.

Esse valor não é definido aleatoriamente, mas sim pela dinâmica de mercado, que estabelece as proporções das trocas. A evolução histórica levou a uma situação onde, em vez de definir trocas individualmente, um padrão de medida foi adotado em relação a uma única mercadoria: o dinheiro. Assim, a moeda se transformou na expressão geral do valor, facilitando todas as trocas.

Na Grécia antiga, essa abstração tornou-se visível e foi observada e incorporada pelo pensamento humano. Na Jônia e em outras regiões gregas, por volta dos séculos VII a V a.C., o surgimento do dinheiro foi reconhecido como uma nova instituição humana. Isso levou filósofos como Pitágoras e Parmênides a explorar essa realidade, sendo também alguns dos primeiros emissores de moedas.

O dinheiro, portanto, materializa a abstração do valor que anteriormente era invisível, e que foi formada socialmente através do comércio. Essa origem real da abstração intelectual é o ponto de partida para o desenvolvimento de disciplinas como filosofia, matemática e ciências naturais. Esse fenômeno explica o surgimento repentino da filosofia e da matemática na Grécia, um evento até então considerado um “milagre grego”.

Sohn-Rethel argumenta que em paralelo ao surgimento de ideias filosóficas, as primeiras moedas também foram cunhadas. Essa relação entre o dinheiro e o desenvolvimento do pensamento abstracto é vista como a chave que desmistifica a transformação intelectual da época.

Parmênides, por exemplo, formulou o conceito abstrato de “ser” como uma essência única que permeia a realidade, refletindo as características do valor abstrato nas mercadorias. Muitos conceitos ao longo da história, desde a filosofia antiga até a física do Renascimento, estão ligados à abstração proporcionada pelo dinheiro.

A suposição de que a matemática abstracta tenha se originado no Egito é rebatida. Embora o papiro de Rhind contenha cálculos anteriores aos gregos, esses são aplicados a problemas específicos e não possuem a abstração teórica encontrada na matemática grega.

A discussão sobre a origem do pensamento abstrato e sua ligação com o dinheiro também se insere em um debate mais amplo sobre a distinção entre trabalho manual e intelectual no contexto do capitalismo. A análise de Sohn-Rethel se fundamenta em conceitos marxistas, juntamente com estudos antropológicos de sociedades primitivas e uma rica referência histórica e filosófica.

Com mais de cinquenta anos de pesquisa, várias versões do texto foram produzidas ao longo do tempo. A edição mais recente, lançada recentemente, representa o estado final da obra, de 1989. Apesar de demandar uma leitura atenta, o livro propõe reflexões profundas sobre a história e a transformação produtiva e tecnológica da sociedade contemporânea.

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