No dia em que se comemora o 80º aniversário da libertação de Bergen-Belsen, um campo de concentração da Alemanha nazista, uma sobrevivente decidiu compartilhar sua experiência sobre os horrores vivenciados durante a Segunda Guerra Mundial, na infância. Aos 88 anos, Lola Hassid Angel relembra como “chegou à idade adulta” aos 8 anos, por ter testemunhado e vivido situações que não deveriam ser enfrentadas por uma criança. Angel é uma das últimas sobreviventes da comunidade judaica grega a escapar do horror de Bergen-Belsen, um campo que teve entre suas vítimas Anne Frank, uma das figuras mais emblemáticas do Holocausto. “O que ocorreu lá foi uma abominação. Uma abominação que será reconhecida pelos historiadores como uma página sombria, mas que nós, os últimos sobreviventes, temos a obrigação de relatar”, afirmou.
A narrativa destaca que em 12 de abril de 1945 as forças nazistas concordaram em entregar o campo, e dois dias depois, em 15 de abril, o exército britânico alcançou o local. Os soldados encontraram uma cena devastadora, com “cheiro de morte por toda parte, em meio a cadáveres empilhados, alguns já em estado de decomposição”. Lola Angel relembra que, enquanto em Auschwitz as mortes eram resultado das câmaras de gás, em Bergen-Belsen a falta de alimento e doenças eram os principais responsáveis pelas perdas. Ela destaca a chegada de milhares de prisioneiras “exaustas e esqueléticas” de Auschwitz em outubro de 1944, entre elas Anne Frank e sua irmã Margot. “Os alemães estavam perdendo a guerra. Sentiam que o tempo estava se esgotando e sabiam que em Bergen-Belsen, onde o tifo era tão comum, a morte estava próxima”, continuou.
A família de Angel fazia parte dos últimos judeus evacuados à força pelos nazistas de Atenas em abril de 1944. Com menos de 7 anos, ela embarcou em um trem. Em sua história, Lola menciona que “de vez em quando” ainda sente o “nó na garganta” que simbolizava seu medo durante aquele período. “No início, recebíamos pacotes da Cruz Vermelha Sueca e éramos tratados de forma relativamente boa. Mas após 6 de junho de 1944, as doações cessaram e passamos a receber apenas um pedaço de pão por dia, com leite diluído pela manhã e uma sopa de água com casca de batata à noite. Passei mais de um ano sem me lavar, estava repleta de piolhos”, relatou.
Conforme os aliados se aproximavam, as forças nazistas decidiram colocar cerca de 2.500 “judeus estrangeiros”, incluindo a família de Lola, em um “trem da morte” rumo ao norte. O comboio foi interceptado por tropas dos Estados Unidos, que libertaram o grupo, proporcionando-lhes um local para se lavar, descansar e se alimentar. “Um soldado americano ficou do lado de fora enquanto um comandante da Marinha nazista foi obrigado a abrir sua casa para nós. Pela primeira vez, dormimos em uma cama suave com edredons e pudemos tomar um banho. Nunca esquecerei do momento em que minha mãe avistou um pequeno punhal sobre uma mesa, pegou-o e disse: ‘Aqueles que vencem podem tomar as armas dos vencidos’. Sinto orgulho desse punhal e ainda o guardo”, recordou.
Atualmente, Angel tem visitado escolas na Grécia para compartilhar informações sobre o Holocausto com os estudantes, que, segundo ela, ficam estarrecidos ao saber que cerca de 1,5 milhão de crianças menores de 13 anos foram vítimas das câmaras de gás durante a guerra. “No final de cada palestra, a sensação é sempre a mesma. Minhas pernas tremem, minha cabeça gira, ao lembrar do que realmente aconteceu há não muito tempo. Os nazistas se especializaram na arte de matar. Meu maior temor é que, caso outro Hitler surja, a próxima guerra será ainda mais devastadora”, concluiu.