Caitlyn Jenner, que passou a maior parte de sua vida como homem e conquistou uma medalha de ouro no decatlo, é pai das irmãs Kardashian e atualmente está experimentando o afeto e o respeito de muitos que se consideram seus seguidores. Por causa de seu apoio a Donald Trump, ela tem recebido comentários como: “E aí, Bruce, como você se sente agora que Trump assinou uma ordem executiva afirmando que existem apenas dois gêneros imutáveis e que seu gênero deve refletir isso?”. Chamar uma pessoa trans pelo nome que ela deixou para trás é uma forma de desrespeito, e os defensores das causas sociais estão aplicando suas próprias regras de maneira equivocada.
De fato, é evidente que Donald Trump está cometendo excessos em uma direção oposta. Não é errado que indivíduos com identidades diversas utilizem documentos que apresentam seus nomes sociais. Os cromossomos continuam sendo XY? Ninguém pode mudar isso, mas a experiência humana vai muito além da biologia. Impedir que as pessoas decidam como desejam ser tratadas é um retrocesso. Essa postura é um reflexo, invertido, dos abusos que ocorreram em nome do que é comumente chamado de ideologia de gênero, especialmente em relação a procedimentos médicos irreversíveis para menores que se identificam como transexuais e à doutrinação de crianças em escolas.
Na esfera jurídica, tanto Trump quanto Javier Milei estão adotando posições semelhantes na luta cultural, que se concentra principalmente nas questões de identidade. Trump demitiu todos os funcionários públicos federais que atuam na área de diversidade, equidade e inclusão (DEI). Ele também proibiu que mulheres trans cumpram pena em prisões federais femininas e vetou os tratamentos médicos para a transição de gênero de detentos com custeio público. Certamente, haverá disputas legais em torno dessas proibições.
Milei busca eliminar a tipificação do feminicídio e terminar com a “cota gay”, que garante 1% dos empregos para transgêneros, travestis e grupos semelhantes. Ele também é a favor do fim dos documentos não-binários. Em Davos, preferiu discutir essas questões em vez de focar nas reformas econômicas que são tão necessárias para a Argentina. Ele fez uma lista de alvos a serem combatidos: “Feminismo, diversidade, inclusão, equidade, imigração, aborto, ecologismo, ideologia de gênero, entre outros, são aspectos de um mesmo problema que visa justificar o aumento do poder estatal”.
“Nenhuma vida vale mais do que outra”, declarou o ministro da Justiça, Mariano Cúneo Libarona. “Por anos, usaram o tema da mulher para enriquecer-se e diminuir o papel do homem”.
Trump e Milei, evidentemente, veem benefícios políticos em suas posturas radicalizadas na batalha cultural. Sob essa perspectiva, eles se dirigem aos que já estão ao seu lado, que os admiram e votam com eles, em vez de tentar conquistar novos apoiadores, especialmente com a promessa de resultados econômicos positivos. Goste-se ou não, essa é a realidade dividida da política contemporânea. Contudo, a intolerância é exatamente o oposto do pensamento libertário que Milei afirma seguir.
Um exemplo de intolerância foram os ataques dirigidos a Caitlyn Jenner. “Por que você não volta a ser homem?”, foi uma das provocações feitas a ela. Quem gostaria de se igualar a alguém que faz esse tipo de comentário? Essa atitude é tão prejudicial quanto a busca pelo vitimismo e a análise das complexidades sociais apenas sob a ótica identitária, culpando a cultura ocidental por todos os problemas do mundo.
Muitos analistas afirmam que a dinâmica política atual favorece a direita, devido ao amplo apoio popular. Seria significativo se Trump ou Milei aproveitassem essa oportunidade para implementar mudanças necessárias. Um exemplo é que, em um único município do estado da Virgínia, havia 52 funcionários dedicados ao programa DEI na educação pública, com um custo de 6,4 milhões de dólares, o que equivale ao salário de 125 novos professores. Essas distorções absurdas precisam ser corrigidas, e não se deve perder tempo com discussões sobre gênero que aparecem em documentos. Essa abordagem poderia levar a um progresso significativo.