A recente implementação de tarifas de importação pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, direcionadas aos principais parceiros comerciais, como México, Canadá e China, levanta questionamentos sobre sua eficácia e impacto no comércio internacional e na economia americana. Essa análise é apresentada pelo diplomata Roberto Abdenur, um veterano das relações internacionais, com ampla experiência no Itamaraty, onde atuou por várias décadas. Atualmente, Abdenur é conselheiro em um think-tank independente brasileiro.
Abdenur expressa preocupação em relação à instabilidade do cenário global, observando que nunca esteve tão caótico e perigoso em mais de sessenta anos de experiência em diplomacia e comércio. Ele destaca que as recentes medidas protecionistas adotadas por Trump podem resultar em dificuldades econômicas significativas, não apenas para os Estados Unidos, mas para todos os países envolvidos nas disputas comerciais.
Após o anúncio das tarifas, os mercados globais reagiram negativamente. O governo do México anunciou um acordo temporário com os EUA para suspender as tarifas por um mês, enquanto o Canadá respondeu com retaliações. Especialistas alertam que a manutenção dessas tarifas pode resultar em um aumento da inflação nos Estados Unidos e uma diminuição do seu PIB.
Abdenur argumenta que as ações de Trump estão desmantelando a ordem mundial criada após a Segunda Guerra Mundial, uma estrutura que, segundo ele, foi inicialmente promovida pelos próprios Estados Unidos. A atual política americana, que se caracteriza pelo uso unilateral de sua influência, representa uma mudança drástica no comportamento diplomático tradicional do país.
Ele também aponta que os prejuízos são esperados em diversas áreas, com os países afetados retaliando as tarifas. Além das tarifas, Abdenur critica a retirada dos EUA de acordos internacionais, como o Acordo de Paris e a Organização Mundial de Saúde, o que pode afetar negativamente iniciativas globais em áreas importantes, como a saúde pública.
Enquanto as tarifas têm uma lógica política sob a ótica do controle de imigração, Abdenur observa que a verdadeira consequências disso pode ser uma deterioração das relações comerciais e de segurança. Embora a possibilidade de uma reversão rápida das tarifas exista, ele expressa ceticismo sobre sua rápida revogação.
Outro ponto abordado é a mudança nas cadeias de suprimento globais. Abdenur indica que nenhum país ou bloco consolidado pode se beneficiar significativamente do fechamento do mercado americano, embora algumas nações possam explorar oportunidades limitadas de comércio com outros parceiros. Além disso, a estratégia americana de acordos bilaterais é também considerada problemática no contexto atual.
A presença crescente da China no cenário comercial global é uma das consequências do processo de globalização e da entrada deste país na Organização Mundial do Comércio. A crescente influência chinesa e sua diplomacia ativa contrastam com o recuo americano, uma situação que requer atenção das nações dependentes dos Estados Unidos.
Abdenur ainda menciona o impulso do agronegócio brasileiro, que pode se beneficiar da situação atual ao explorar novos mercados enquanto retaliações contrárias aos EUA surgem. Entretanto, ele expressa preocupação com ataques ideológicos, uma vez que o governo Trump tem uma posição crítica em relação a regimes que considera de esquerda, incluindo o Brasil.
A presidência brasileira dos Brics também é um ponto de tensão, já que conversas sobre alternativas ao dólar podem colocar o Brasil em um caminho desafiador em relação aos EUA. Abdenur acredita que a pauta do dólar poderá gerar retaliações significativas, afetando negativamente a economia brasileira.
Em relação às exportações, o impacto de tarifas adicionais para produtos brasileiros, como os aviões da Embraer, é uma possibilidade, embora a mecanização da indústria e a dependência de componentes americanos possam dificultar essa imposição.
Por fim, Abdenur prevê que a política tarifária de Trump pode ser insustentável a longo prazo. Ele argumenta que as implantações de tarifas e a retórica protecionista, se continuadas, podem fortalecer a oposição política nos EUA e levar a uma possível mudança nos resultados eleitorais.
