A deputada federal Erika Hilton, do PSOL-SP, declarou que sua identidade de gênero foi alterada para “masculino” em um visto diplomático concedido pelos Estados Unidos. Ela caracteriza essa situação como uma forma de “violência”, “desrespeito” e “abuso”. Este incidente não é único, pois anteriormente, a atriz trans Hunter Schafer, famosa pela série Euphoria, também relatou ter recebido um passaporte com a designação de gênero “masculino”. Schafer explicou em um vídeo nas redes sociais que precisou solicitar um novo passaporte após o roubo do original.
A atriz, que tem 26 anos, mencionou que desde sua adolescência, quando obteve sua carteira de motorista, sempre teve seus documentos com a indicação de “feminino”, e nunca enfrentou problemas nesse aspecto. Schafer expressou incertezas sobre o que teria mudado no processo de emissão dos documentos, mas acredita que a mudança é uma consequência da nova administração nos Estados Unidos. No primeiro dia de seu retorno à presidência, Donald Trump havia instruído que o governo federal reconhecesse apenas dois gêneros biologicamente distintos—masculino e feminino—e que as agências federais não subsidiassem “ideologias de gênero”. As diretrizes estabelecidas exigiam que o Departamento de Estado ajustasse suas políticas para emitir passaportes que representassem com precisão o sexo do portador, o que foi implementado rapidamente.
O decreto de Trump foi objeto de contestação por organizações que defendem os direitos civis. A União Americana pelas Liberdades Civis (ACLU) entrou com uma ação judicial representando sete indivíduos transgêneros e não binários, alegando que a política discriminava inconstitucionalmente estas pessoas e as expunha a riscos potenciais durante viagens. A advogada da ACLU, Sruti Swaminathan, declarou que essa ordem executiva tornou inviável a obtenção de documentos de identidade federais adequados para americanos transgêneros, não binários e intersexuais, incluindo passaportes. A juíza distrital dos EUA, Julia Kobick, durante uma audiência em Boston, mostrou-se receptiva aos argumentos apresentados e questionou um advogado do Departamento de Justiça dos EUA sobre os riscos que a nova política impunha ao uso dos passaportes. Kobick ressaltou que isso poderia expor pessoas transgêneras a discriminação em outros países.
No caso de Erika Hilton, a parlamentar foi convidada a participar de um evento na Universidade de Harvard e no Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT). Contudo, ao receber um visto com o gênero “masculino”, decidiu cancelar sua viagem aos Estados Unidos, onde participaria da Brazil Conference 2025. Hilton, que foi eleita em 2022, é uma das duas primeiras deputadas transexuais a assumir um papel na Câmara dos Deputados, junto com Duda Salabert, do PDT-MG. A deputada ressaltou que é incompreensível que o preconceito que Trump alimenta contra as pessoas trans tenha impactado uma parlamentar brasileira em uma missão oficial.
A assessoria de imprensa de Hilton informou que em uma versão anterior de seu visto, emitida em 2023, a designação de gênero estava correta, conforme sua identidade. O visto, que tinha validade de dois anos, expirou antes do evento deste mês. De acordo com informações apuradas, a parlamentar está preparando uma ação internacional contra o governo dos EUA e busca agendar um encontro com o ministro das Relações Exteriores, Mauro Vieira. Em resposta à solicitação de comentários, a Embaixada dos Estados Unidos declarou que a política do país é de reconhecer apenas os dois sexos, masculino e feminino, considerados imutáveis desde o nascimento, e acrescentou que, conforme a legislação americana, os registros de visto são confidenciais, portanto, não comentariam casos individuais.