14 abril 2025
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Como o Kit Gay Enfrenta o Conservadorismo na Sociedade Brasileira

Em 2018, durante o processo de defesa de sua dissertação de mestrado na UFRJ, Allan Santos se deparou com um cenário político polarizado no Brasil. De um lado, Jair Bolsonaro promovendo a “pátria e a moralidade”, e do outro, Fernando Haddad, que buscava recuperar o poder para o PT. Nesse período, emergiu um fenômeno crescente de desinformação, com intensas discussões sobre a introdução de educação sexual nas escolas. Allan decidiu então investigar a disseminação de fake news que permeou as eleições daquele ano, dando início a suas pesquisas que culminaram em sua tese de doutorado. Autor do livro “A fabricação do pânico sexual bolsonarista: do ‘kit gay’ à ‘mamadeira de piroca’”, ele analisa o impacto do discurso da extrema-direita na sociedade conservadora. Em uma entrevista, ele expõe como esse discurso é utilizado estrategicamente por políticos para engajar um grupo que se vê ameaçado pelo progresso social.

A discussão inicial de Allan aconteceu em torno da censura à arte no Brasil. Com a proximidade das eleições e com a candidatura de Bolsonaro, surgiu a necessidade de uma análise mais profunda dos acontecimentos, especialmente no que se referia ao tema do kit gay, uma narrativa polarizadora.

A questão da apropriação do discurso por Bolsonaro é complexa. Embora ele não seja o criador desse discurso, ele se inseriu em um contexto onde figuras como Silas Malafaia e Eduardo Bolsonaro também se destacaram. O kit gay já existia antes, mas Bolsonaro se tornou um dos principais disseminadores deste e de outras narrativas, como a “mamadeira de piroca”, que voltaram aos holofotes nas eleições de 2022. Essa propaganda de medo se espalhou por meio das redes sociais, levando muitos a acreditar em informações distorcidas que influenciaram suas decisões.

O fenômeno do alarmismo em torno do kit gay reflete uma resistência da sociedade conservadora em abdicar de seus privilégios de gênero e classe. A pesquisa de Allan revela um desconforto com a ideia de que a extrema-direita não opera com uma estratégia política. A análise dos discursos políticos, especialmente em períodos eleitorais, sugere que há uma clara intencionalidade no uso de temas relacionados a gênero para impulsionar essas narrativas.

A moralidade serviu como base para as disputas de poder, onde bolsonarismo representa um projeto político que transcende a figura de Jair Bolsonaro. Essa batalha por significados em torno de direitos humanos, democracia e liberdade de expressão se intensifica nas redes sociais, que se tornaram instrumentos valiosos para a manutenção do status quo.

A influência das fake news, como a relacionada à mamadeira de piroca, sobre as eleições é notável. Em 2018, um vídeo viralizou no Facebook, alegando que essas mamadeiras eram distribuídas nas creches brasileiras, e apesar de ordens judiciais para sua remoção, a informação já havia se espalhado amplamente. A mamadeira passou a simbolizar a absorção de um discurso que se sedimentou ao longo de anos.

As pessoas que compartilham esses conteúdos costumam acreditar na veracidade das informações, sem o intuito de enganar. Essas narrativas são frequentemente disseminadas em grupos familiares, comunitários e religiosos, onde existe um desejo de corroborar crenças e ideologias preexistentes.

O discurso moral continua a ser uma tônica para as disputas eleitorais de 2026. A dinâmica política nos Estados Unidos, embora com suas particularidades, inspira o comportamento da extrema-direita brasileira, que usa a moralidade e questões de gênero como ferramentas de ataque. Uma evolução nesse discurso emergente é a mudança para temas como a transexualidade e as cirurgias de redesignação de gênero sem o consentimento dos responsáveis.

O fenômeno da desinformação, mais amplo que apenas uma crítica ao jornalismo convencional, revela uma resistência à aceitação de fontes confiáveis e verificadas. O desafio está na disposição das pessoas em acreditar em narrativas que confortam suas convicções, sendo necessária uma mudança cultural e educacional que se desenvolverá ao longo de gerações.

Por fim, a classe social também desempenha um papel significativo nessa dinâmica, com indivíduos de classes mais baixas sendo frequentemente os mais impactados. Eles tendem a ver na extrema-direita a promessa de segurança, paz e melhorias nos serviços públicos. A identificação com práticas religiosas, valores morais ou militarismo pode reforçar essa crença e assimilar informações que sustentam essas percepções.

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