Com o fim do cessar-fogo em Gaza e a interrupção do envio de ajuda por parte de Israel, muitas crianças que sofreram amputações devido aos bombardeios nesse território se encontram em uma situação extremamente vulnerável. A OCHA, organização de ajuda humanitária da ONU, classificou essa crise como o “maior conjunto de crianças amputadas na história moderna”. Desde o início do conflito, que se prolonga há 17 meses, a demanda por próteses, cadeiras de rodas e atendimentos médicos ultrapassa em muito a disponibilidade desses recursos. Um cessar-fogo temporário em janeiro permitiu a entrega de alguns suprimentos, mas apenas 20% das necessidades foram atendidas, conforme informado por Loay Abu Saif, diretor do programa de deficiência da Medical Aid for Palestine (MAP).
A situação se deteriorou ainda mais com o reinício dos ataques israelenses e o bloqueio completo de suprimentos médicos e humanitários instaurado em 2 de março. O número de amputações segue aumentando à medida que novos bombardeios ocorrem, ocasionando a morte de centenas de palestinos. Especialistas em reabilitação no local, Jamal al-Rozzi e Hussein Abu Mansour, relataram que entre 3 a 4 mil crianças já sofreram amputações em Gaza até 4 de novembro do ano passado. A Organização Mundial da Saúde (OMS) estima que até 17.500 pessoas tenham sofrido ferimentos graves nos membros e estejam necessitando de assistência médica.
A falta de tratamento adequado é um fator crítico, uma vez que muitos casos de amputações poderiam ter sido evitados. Profissionais de saúde têm relatado a dificuldade em tratar infecções devido à escassez de medicamentos essenciais, resultando na necessidade de amputar membros que no passado poderiam ter sido salvos sem complicações. Instituições humanitárias, como o Comitê Internacional da Cruz Vermelha, conseguem fornecer próteses e reabilitação a centenas de pacientes, mas enfrentam escassez de recursos. Há uma demanda urgente por cadeiras de rodas, enquanto Israel restringe a entrada de materiais necessários para a fabricação de próteses, justificando que esses insumos poderiam ser utilizados para finalidades militares.
Algumas crianças amputadas conseguiram ser encaminhadas para tratamento fora de Gaza, embora o número de transferências tenha diminuído em função da intensificação dos ataques israelenses. Aproximadamente 13 mil pacientes estão à espera de autorização para deixar Gaza em busca de cuidados médicos. Para as crianças afetadas, a dura realidade dos campos de refugiados piora ainda mais a recuperação.
Além das lesões físicas, as crianças amputadas enfrentam problemas psicológicos significativos. Uma menina chamada Sila, que perdeu membros em um ataque que resultou na morte de sua família, tenta brincar com outras crianças, mas frequentemente cai. Segundo sua tia, Sila questiona constantemente: “Por que sou assim? Por que não sou como elas?”. Outra criança, Reem, de 11 anos, perdeu uma mão enquanto tentava escapar com sua família e agora depende de ajuda para atividades cotidianas, frequentemente se isolando quando não recebe assistência. Sua mãe relatou episódios de desespero da filha, que já expressou o desejo de morrer.
A violência continua em Gaza, com Israel bombardeando áreas densamente povoadas. Em 24 de novembro, o Ministério da Saúde palestino divulgou uma lista com mais de 15 mil crianças mortas desde o início da ofensiva israelense em 7 de outubro de 2023, em resposta a ataques do Hamas na mesma data. Esta lista contém quase 5 mil crianças com menos de 6 anos, incluindo 876 bebês que não completaram um ano de vida. Até o momento, mais de 50 mil palestinos perderam a vida e mais de 113 mil ficaram feridos, enquanto a destruição forçou o deslocamento de 90% da população de 2,3 milhões de pessoas.