Na década de 1970, a sonda Mariner 9, da NASA, divulgou imagens que mostravam superfícies em Marte esculpidas pela água, esclarecendo a questão sobre a possível existência de fluxo hídrico no planeta vermelho. Desde então, várias evidências têm emergido, destacando que a água desempenhou um papel significativo na história marciana.
Meteoritos provenientes de Marte indicam a presença de água há cerca de 4,5 bilhões de anos, e crateras formadas em tempos recentes revelam a continuidade do gelo sob a superfície até os dias atuais. Pesquisas contemporâneas se concentram em determinar quando a água surgiu em Marte, sua abundância e a duração dessa presença. Um dos tópicos mais discutidos atualmente é a questão da existência de oceanos antigos no planeta.
Um estudo recente publicado na PNAS, realizado por uma equipe de cientistas chineses e americanos liderada por Jianhui Li, da Universidade de Guangzhou, trouxe novas perspectivas sobre essa questão. A pesquisa se baseou nas informações coletadas pela sonda Zhurong, da Administração Espacial Nacional da China, que está atualmente explorando Marte.
Os dados obtidos pelo Zhurong revelam detalhes sem precedentes sobre rochas enterradas que, segundo hipótese, estariam localizadas próximas ao que poderia ter sido um litoral há bilhões de anos. Os pesquisadores identificaram depósitos que sugerem a presença de uma antiga praia gerada por um oceano marciano.
Os veículos de exploração em Marte, como o Zhurong e o Perseverance, investigam aspectos diversos do planeta, como sua geologia e atmosfera, sempre em busca de indícios de água. A detecção de água é importante porque esse elemento é fundamental para a possibilidade de vida.
As rochas sedimentares são frequentemente avaliadas, uma vez que podem conter sinais da presença de água e, consequentemente, de vida. O Perseverance, por exemplo, está analisando depósitos em uma cratera que acredita-se ter sido um lago, enquanto o Zhurong examina sinais de um oceano no hemisfério norte do planeta.
O rover Zhurong foi lançado em 2020 e operou em Marte entre 2021 e 2022. Sua aterrissagem ocorreu na Utopia Planitia, a maior bacia de impacto do planeta, e sua investigação incluiu áreas com características geológicas que se assemelham a antigos litorais que sugestivamente poderiam ser restos de um oceano global.
As opiniões científicas quanto à existência desse oceano são divergentes, necessitando de mais pesquisas para chegar a um consenso. O registro geológico terrestre, por outro lado, é claro sobre a idade dos oceanos, com muitos deles datando de vários bilhões de anos.
Para avaliar se as rochas em Utopia Planitia foram de fato formadas por um oceano, o Zhurong coletou dados ao longo de um transecto de 1,3 km na borda da bacia, utilizando uma técnica que penetra a superfície até 100 metros de profundidade. As características reveladas indicam a presença de camadas refletivas de rochas que apresentam uma orientação consistente com sedimentos depositados em ambientes marinhos.
As anomalias detectadas pelo radar de penetração confirmam a natureza sedimentar das rochas, diferenciando-as de possíveis fluxos vulcânicos. Comparações entre os dados coletados por Zhurong e informações de ambientes sedimentares na Terra demonstraram que as rochas em análise são congruentes com sedimentos costeiros típicos de regiões oceânicas.
Um período marcado pela presença de água na superfície marciana, conhecido como Noachiano, ocorreu entre 4,1 e 3,7 bilhões de anos atrás, apresentando evidências substanciais de água em sua superfície. Já durante o período Hesperiano, que vai de 3,7 a 3 bilhões de anos atrás, as evidências de água são escassas.
Embora seja observado que o planeta parecia ter esfriado e secado no período Hesperiano, a descoberta de depósitos costeiros pelo Zhurong sugere que Marte pode ter mantido água na superfície por um período mais longo do que se supunha. O que implica possíveis ambientes habitáveis em torno de um oceano que podem ter persistido por mais tempo na história de Marte.