Todas as sociedades possuem formas de compreender a natureza, baseadas em suas experiências diretas com ela. Por exemplo, agricultores necessitam entender as estações e as condições climáticas para determinar o momento adequado para plantar e colher. Da mesma forma, caçadores devem conhecer o comportamento dos animais para que possam caçá-los eficazmente.
Esse entendimento do mundo natural, no entanto, não se configura exatamente como ciência. A ciência geralmente é entendida como um conhecimento mais formal e estruturado. Trata-se não apenas de explicações, mas sim de um sistema que se vale de observações e experimentações para formular teorias que são documentadas, compartilhadas e, eventualmente, aprimoradas.
Com isso em mente, pode-se afirmar que a primeira grande contribuição científica registrada é a astronomia babilônica. Os babilônios habitaram a região atualmente conhecida como Iraque entre 2.500 e 4.000 anos atrás. O que distingue a astronomia babilônica como uma disciplina científica é a meticulosidade com que os escribas babilônicos, conhecidos como guardiães do conhecimento, observavam, anotavam e, subsequentemente, previam matematicamente os movimentos do Sol, da Lua, das estrelas e dos planetas.
A astronomia babilônica possuía características essencialmente científicas. Antes da invenção de relógios, a referência para a passagem do tempo era a observação do céu. Durante o dia, a posição do Sol indicava a hora, enquanto à noite, a disposição das estrelas cumpria a mesma função. Além disso, muitos calendários eram fundamentados na combinação de ciclos celestiais. Um mês, por exemplo, corresponde ao período em que a Lua completa suas fases, enquanto um ano é calculado como o tempo que a Terra leva para orbitá-lo.
Entretanto, a crença babilônica na astronomia ia além da simples contagem do tempo. A sociedade babilônica, assim como o mundo contemporâneo, era permeada tanto por previsibilidade quanto por caos. O clima variava conforme as estações; as safras eram cultivadas e colhidas, festas comemoradas, e a vida seguia seu curso com nascimentos e mortes. Entretanto, eventos imprevisíveis como uma má colheita poderiam elevar os preços e provocar fome, falecimentos prematuros de líderes poderiam desencadear crises políticas, e epidemias poderiam ceifar milhares de vidas.
As estrelas e os planetas apresentavam-se com um comportamento semelhante, por vezes sendo constantes, como as constelações, que mantinham posições fixas umas em relação às outras, e noutros momentos eram imprevisíveis. Enquanto as constelações surgiam e desapareciam em ciclos regulares, os planetas exibiam um movimento errático, às vezes aparentando retroceder em suas órbitas. Fenômenos astronômicos raros, como eclipses, também eram observados.
Para os babilônios, tais variações eram consideradas interconectadas. Mudanças nos movimentos planetários ou eventos raros, como eclipses, eram interpretados como presságios e indícios do que poderia ocorrer na Terra. Por exemplo, a movimentação da sombra da Terra sobre a Lua durante um eclipse lunar poderia ser vista como um sinal de uma possível inundação.
Os escribas mantinham um compêndio denominado Enūma Anu Enlil, que catalogava esses presságios e seus significados. Dessa forma, se os movimentos variáveis dos corpos celestes fossem previsíveis, a crença era que eventos na Terra também poderiam ser. Essa conexão impulsionou o estudo da astronomia entre os escribas.
A base da astronomia babilônica era registrada num tratado conhecido como MUL.APIN, que significa “A Estrela do Arado”, uma alusão a uma constelação. Este documento continha informações sobre as posições das estrelas, os momentos em que se tornariam visíveis ao longo do ano, os trajetos do Sol e da Lua, os períodos em que os planetas poderiam ser avistados no céu noturno, e outros conhecimentos astronômicos essenciais.
Subsequentemente, os escribas babilônicos passaram a manter os chamados Diários Astronômicos, que continham registros meticulosos das posições da Lua e dos planetas, além de eventos terrestres como oscilações climáticas e variações nos preços dos grãos. Assim, eles documentavam tanto as observações relacionadas aos presságios astronômicos quanto aos eventos que poderiam ser antecipados.
Esse compromisso com a observação e a documentação é um elemento central da prática científica. Os Diários Astronômicos foram mantidos por mais de 700 anos, tornando-se possivelmente o projeto científico mais prolongado já registrado.
Os dados contidos nos Diários Astronômicos possibilitaram aos escribas babilônicos avançar ainda mais na previsão de eventos astronômicos. Uma parte dessa atividade envolvia calcular o que era chamado de anos-meta, ou seja, quantos anos um planeta levava para retornar à mesma posição no mesmo dia. Por exemplo, determinaram que Vênus completa sua órbita em oito anos babilônicos, significando que, se ele estivesse em uma posição específica em um determinado dia, estaria novamente nessa mesma posição oito anos depois.
Por volta do século IV a.C., os escribas aprimoraram esse conhecimento em um sistema de previsões matemáticas de eventos astronômicos, desenvolvendo tabelas chamadas efemérides, que indicavam a ocorrência futura desses eventos. Assim, os escribas babilônicos alcançaram seu objetivo, tornando os movimentos do Sol, da Lua e dos planetas previsíveis.
A astronomia babilônica teve uma influência significativa sobre astronomias futuras, um impacto que é sentido até os dias atuais. Os astrônomos gregos utilizaram as observações babilônicas para formular modelos geométricos do movimento planetário, contribuindo para a evolução da astronomia moderna. As efemérides tornaram-se os predecessores das tabelas astronômicas, que ainda são utilizadas. Por exemplo, a NASA mantém uma tabela de eclipses online que se estende até o ano 3000.
Além disso, um aspecto da astronomia babilônica que permanece familiar é a maneira como a sociedade contemporânea mede o tempo. Os babilônios não adotavam um sistema decimal baseado em 10, como o utilizado atualmente, mas sim um sistema sexagesimal, que se baseia em 60. As observações babilônicas eram tão relevantes que culturas subsequentes retiveram essas unidades de medida na astronomia, mesmo tendo adotado um sistema de base 10 em outras áreas.
Dessa forma, a medida do tempo que conhecemos, onde uma hora é subdividida em 60 minutos e um minuto em 60 segundos, é um legado da astronomia babilônica. Cada vez que se consulta um relógio, está-se recorrendo a uma das mais antigas ciências conhecidas pela humanidade.