Com a implementação da legislação sobre offshore, que eliminou a postergação fiscal sobre os lucros obtidos no exterior e estabeleceu diretrizes para a tributação, proprietários de grandes fortunas enfrentam, ao longo de 2024, a necessidade de decidir sobre as estruturas que desejam adotar e os regimes tributários aplicáveis a seus investimentos internacionais. Em 2025, esses contribuintes farão o pagamento, pela primeira vez, referentes a essa tributação no Imposto de Renda, e começam a compreender os impactos dessa nova medida e de suas escolhas.
Até 5 de abril, indivíduos que possuem mais de US$ 1 milhão em contas jurídicas no exterior são obrigados a enviar ao Banco Central o balanço de suas empresas e o lucro obtido. Essa exigência, por enquanto, permanece inalterada. Contudo, agora, na declaração de Imposto de Renda da pessoa física, é necessário declarar esse lucro e pagar um imposto de 15% sobre ele até o dia 30 de maio. A tributação varia conforme o regime escolhido pelo titular da offshore, seja ele transparente ou opaco.
No regime transparente, as variações cambiais são consideradas. Neste caso, os ativos são declarados anualmente, e não a empresa offshore em si. Dessa forma, o lucro tributável é calculado somente no momento em que a realização ocorre. Por outro lado, no regime opaco, que é a escolha de 95% das offshores por permitir a ausência de tributação sobre a variação cambial, o lucro tributável é aquele apurado no balanço da empresa, levando em conta todos os ativos da empresa pela marcação a mercado. Isso implica que até mesmo os lucros não realizados serão tributados, resultando em uma conta maior do que muitos esperavam.
Este aumento no imposto devido está ligado, em parte, ao bom desempenho dos investimentos no exterior em 2024. O índice Nasdaq teve uma valorização de quase 30%, enquanto o S&P 500 cresceu mais de 23%. As treasuries americanas, por sua vez, apresentaram retorno superior a 4% ao ano. De acordo com análises de instituições financeiras e family offices, o retorno global médio gira em torno de 10%, considerando diferentes perfis de investimento.
Outro fator que contribui para o montante elevado de tributos é a alta do dólar, que encerrou o ano a R$ 6,19 em 31 de dezembro, data utilizada para o cálculo do imposto. Um levantamento realizado por um escritório de advocacia especializado em tributação considera um portfólio de US$ 1 milhão com um retorno de 10% em 2024. A tributação em reais resultaria em R$ 619.000, resultando em um imposto a ser pago de R$ 92.850, ao se aplicar a alíquota de 15%.
Contribuintes relatam um aumento significativo na carga tributária, especialmente aqueles que optaram pelo regime opaco sob a suposição de que o câmbio se valorizaria constantemente. A situação atual, no entanto, pegou muitas pessoas de surpresa, levando a questionamentos sobre a escolha do regime tributário. É importante destacar que mesmo que ocorra uma compensação em anos anteriores devido à variação do câmbio, os tributos devem ser pagos agora, e já na primeira declaração, muitos enfrentam situações desfavoráveis.
De acordo com estimativas governamentais, aproximadamente 100 mil brasileiros detêm cerca de US$ 200 bilhões em contas offshore, o que poderia gerar, sob essas premissas, mais de R$ 18 bilhões em impostos. Com essa realidade, contribuintes são pressionados a encontrar maneiras de saldar suas obrigações tributárias. Questões de liquidez tornam-se centrais, já que é crucial determinar se existe caixa disponível ou se será necessário resgatar investimentos.
O ideal, em termos contábeis, seria resgatar investimentos do exterior para liquidar o imposto devido. No entanto, o cenário atual pode não ser favorável para esses resgates. O dólar, por exemplo, caiu para cerca de R$ 5,70, representando uma desvalorização de quase 8% em relação à cotação de 31 de dezembro. Além disso, o desempenho das bolsas americanas também se deteriorou neste ano, com o S&P 500 apresentando uma queda de mais de 4% e o índice Nasdaq sofrendo uma desvalorização de 10%. Resgatar investimentos agora poderia significar realizar perdas financeiras.
Gestores de grandes fortunas estão examinando a abordagem a ser adotada para o pagamento dos impostos de forma individualizada. O mais provável é que utilize recursos provenientes de investimentos realizados no Brasil para atender essa obrigação tributária. O investimento em offshores é percebido como um compromisso de longo prazo e, por isso, não é desejável resgatar agora, dada a instabilidade do mercado.
Indivíduos que não operam através de uma offshore, ou Private Investment Company (PIC), e realizam investimentos como pessoa física, não são tributados pela renda não realizada, conforme a legislação brasileira. A distinção no tratamento tributário pode ser considerada controversa e suscetível de discussão legal. A tributação de expectativa de renda ou lucros não realizados levanta questionamentos sobre sua legalidade.
A realidade apresentada demonstra que investidores de grandes fortunas estão enfrentando dificuldades significativas e reavaliando suas estruturas de investimento. Uma das reflexões emergentes é a viabilidade de deixar determinados ativos sob a titularidade da pessoa física. Apesar disso, as offshores oferecem benefícios sucessórios que não estão disponíveis para investigações diretas sob a pessoa física, especialmente em caso de falecimento, onde o imposto sobre herança nos Estados Unidos pode atingir 40% do montante. Uma alternativa viável pode incluir a abertura de outra offshore sob o regime transparente para aplicações de longo prazo.