Informar aos investidores sobre as futuras direções empresariais é uma prática comum no mundo dos negócios. Contudo, com a atual instabilidade tarifária que permeia a economia, diversas grandes empresas estão optando por suspender suas previsões financeiras. O ambiente corporativo nos Estados Unidos se encontra em um estado de incerteza, aguardando definições sobre a aplicação das tarifas retaliatórias de Trump, que foram adiadas por 90 dias em abril.
Essa falta de clareza resulta em um cenário em que muitas empresas interrompem suas orientações, ou seja, postponem a divulgação de suas expectativas de lucros. Tal situação não é um indicativo positivo da saúde econômica global. Durante os lockdowns impostos pela Covid-19, várias organizações também optaram por suspender suas previsões, temendo comunicar informações imprecisas em meio à crise.
A suspensão de orientações representa um desafio significativo para analistas, que comumente dependem dessas informações para entender o desempenho futuro das empresas. A orientação é um termômetro sobre como as corporações percebem o comportamento da economia. O mesmo se aplica ao contexto da guerra comercial em curso, onde as constantes mudanças nas políticas tarifárias geram insegurança e forçam as empresas a reconsiderar seus modelos de negócios.
Algumas grandes empresas já começaram a ajustar suas previsões, evidenciando os impactos da guerra comercial nas expectativas econômicas. A fabricante de automóveis Stellantis, que detém marcas como Jeep e Dodge, anunciou a suspensão de suas projeções de crescimento lucrativo para o ano, citando a dificuldade em avaliar as implicações das políticas tarifárias em evolução. Esta declaração seguiu-se a um comentário da General Motors, que também retirou sua previsão de lucros crescentes até 2025, justificando a mudança pela não consideração de potenciais impactos tarifários. A montadora alemã Mercedes-Benz também anunciou a suspensão de suas orientações financeiras.
No setor tecnológico, as ações da plataforma de mídia social Snap caíram até 14% após a empresa informar que não iria divulgar previsões para o segundo trimestre, alegando incertezas no ambiente econômico que poderiam afetar a demanda por publicidade. Além disso, as principais companhias aéreas, incluindo American Airlines, Delta, Southwest e Alaska Air, retiraram suas orientações financeiras para o ano devido ao aumento da incerteza.
O CEO da Delta Air Lines, Ed Bastian, alertou que a economia dos Estados Unidos poderia entrar em recessão, enquanto a empresa observou que “o crescimento praticamente estagnou”. Ele mencionou que os clientes mais sensíveis a preços estão reduzindo suas viagens, que são vistas como opções mais discricionárias. O vice-presidente da American Airlines, Steve Johnson, também apontou que as viagens entre os americanos de baixa renda estão diminuindo.
Embora nem todas as empresas tenham suspendido completamente suas orientações, a incerteza crescente faz com que algumas considerem essa possibilidade em um futuro próximo. A UPS, por exemplo, afirmou que não abandonaria suas orientações, mas indicou que essa decisão poderia ser revista em breve. A CEO da UPS, Carol Tome, comentou sobre a incerteza que pode afetar o consumidor americano devido às tarifas e lamentou que o sentimento do consumidor atualmente está abaixo do nível do início do ano, mas mencionou que ele permanece relativamente saudável.
Quando as empresas optam por retirar suas orientações, como apontou Paul Beland, Chefe Global de Pesquisa da CFRA, isso gera uma grande incerteza, um cenário que vem se tornando comum. Mesmo com avaliações ainda elevadas para as empresas listadas no S&P 500, as expectativas de crescimento de lucros sofreram queda nos últimos seis meses.
Existem semelhanças entre as orientações retiradas durante o auge da pandemia e a situação atual, visto que, assim como a pandemia, as tarifas estão gerando um choque nas cadeias de suprimentos de difícil previsão. Diferentemente do período da pandemia, onde o Federal Reserve estava imprimindo dinheiro e o governo distribuindo cheques de estímulo, atualmente não há uma rede de segurança semelhante. O governo está focado em diminuir o déficit, enquanto o Federal Reserve continua combatendo a inflação, o que traz à tona uma questão estrutural na economia global.