Um amuleto de prata datado do século X, descoberto na Suécia, ilustra uma figura feminina com ventre saliente e um possível capacete, sendo considerado a única representação convincente de gravidez na era viking. Esta descoberta desafia a noção de que a gravidez era um tema exclusivamente privado ou invisível nas sociedades vikings, que atribuíam à gestação um conjunto complexo de significados.
Um estudo recente, publicado no Cambridge Archaeological Journal, analisou textos medievais, descobertas arqueológicas e registros funerários, oferecendo uma visão aprofundada sobre como a gravidez era percebida entre os séculos VIII e XI. As análises revelam que a gravidez não era vista como uma condição neutra ou meramente biológica; ao contrário, ela estava entrelaçada com relações de poder, linhagens e dinâmicas de violência.
Nos textos nórdicos, mulheres grávidas são frequentemente descritas em termos que combinam observações físicas com julgamentos simbólicos. A utilização de termos como “inchada”, “pesada” e “doente” sugere uma percepção de desconforto e vulnerabilidade associada à gestação. Ao mesmo tempo, expressões como “mulher que não caminha sozinha” indicam que o feto poderia ser considerado uma entidade autônoma, com um status próprio. Algumas narrativas também incorporaram o bebê ainda no ventre em tramas de vingança e alianças familiares, reforçando a ideia de que o corpo grávido tinha importância política.
A ligação entre gravidez e poder é evidenciada em registros visuais, com um artefato raro em destaque. A estatueta em prata encontrada na Suécia, mostrando uma figura com o ventre saliente e um possível capacete, é única por sua representação de uma mulher grávida no contexto viking. Este objeto foi descoberto em uma tumba feminina cercada por itens com conotações de magia e autoridade simbólica, como um bastão de ferro e outros pingentes rituais. A presença do capacete nesse contexto sugere que o corpo gestante poderia não apenas ser associado à força e resistência, mas também à autonomia. Isso desafia a ideia de que gravidez está intrinsicamente ligada à passividade.
Apesar das evidências literárias e visuais, a presença de corpos gestantes nos registros funerários é quase inexistente. Entre os milhares de túmulos escavados na Escandinávia e em áreas influenciadas pela cultura viking, apenas 14 casos de restos mortais de mulheres e fetos foram identificados. Em alguns casos, recém-nascidos foram enterrados ao lado de adultos, indicando que as ligações entre pais e filhos não eram sempre determinadas por critérios biológicos.
A raridade de sepultamentos conjuntos de mães e filhos levou os pesquisadores a considerar que a ausência de corpos gestantes nos registros arqueológicos pode ser intencional, resultado de práticas funerárias distintas ou uma lógica de invisibilização. O estudo sugere que essa escassez reflete uma "política de apagamento" do corpo gestante, que, mesmo sendo fundamental para a reprodução social, foi marginalizado tanto nos registros simbólicos quanto materiais, assim como na historiografia relacionada.