O presidente de Ruanda, Paul Kagame, expressou sua concordância com as autoridades dos Estados Unidos sobre a urgência de um cessar-fogo na região leste da República Democrática do Congo (RDC). No entanto, não deu indícios de estar disposto a atender aos pedidos para a retirada das tropas ruandesas e dos rebeldes do M23, que recebem apoio do país, de Goma. Os insurgentes avançaram em direção a Goma, a principal cidade do leste da RDC, na segunda-feira, em uma das mais graves escaladas de um conflito que perdura há mais de uma década, resultando em hospitais lotados de pacientes feridos por balas, explosivos e fragmentos.
Os Estados Unidos solicitaram ao Conselho de Segurança das Nações Unidas na terça-feira que considerasse a adoção de medidas ainda não especificadas para interromper a ofensiva rebelde, que já forçou dezenas de milhares de pessoas a abandonar suas residências. O Conselho conta com autoridade para impor sanções.
Na cidade de Goma, localizada na província de Kivu do Norte, ocorreram saques em lojas e residências. Após vários dias de confrontos intensos, a situação na cidade estava, em grande parte, tranquila na quarta-feira, com algumas disparos isolados, conforme contado por moradores locais. “Tive uma conversa produtiva com o Secretário [de Estado Marco] Rubio sobre a necessidade de um cessar-fogo no leste da RDC e sobre como abordar as causas históricas do conflito de forma definitiva”, relatou Kagame em uma postagem.
Rubio expressou a Kagame que Washington estava “profundamente alarmado” com a escalada de um conflito que já dura três décadas, cujas raízes se encontram nas consequências do genocídio em Ruanda e nas disputas pelo controle dos recursos minerais no Congo. Tanto o Congo quanto o líder da missão de manutenção da paz da ONU afirmaram que tropas de Ruanda estão ativas em Goma, apoiando seus aliados do M23. Ruanda, por sua vez, defendeu que está apenas se protegendo da ameaça representada por milícias congolezas, sem confirmar diretamente se suas tropas cruzaram a fronteira.
O Secretário de Estado dos EUA pediu um cessar-fogo imediato na região e que todas as partes respeitem a soberania territorial. Por sua vez, fontes da ONU relataram que os Exércitos da RDC e de Ruanda trocaram tiros na fronteira no dia anterior, enquanto os rebeldes tentavam estabelecer controle sobre Goma, um ponto estratégico para o comércio de valiosos minérios, como estanho e tântalo, pela segunda vez em 13 anos.
Em um estádio em Goma, na terça-feira, centenas de soldados do governo desarmados, juntamente com combatentes da milícia, estavam sentados no campo, enquanto outros se alinhavam em um que foi descrito como um processo de desarmamento pelos integrantes do M23, conforme um vídeo não verificado acessado. “Explosões e tiros ainda podem ser ouvidos em áreas periféricas de Goma. A noite foi tranquila após os rebeldes tomarem o centro, mas houve saques. Aeroporto, internet, eletricidade e água foram cortados”, relatou um cidadão por mensagem.
O M23 representa o mais recente episódio de uma sequência de revoltas lideradas por tutsis étnicos, apoiados por Ruanda, que têm gerado instabilidade no Congo desde o desfecho do genocídio em Ruanda, ocorrido há três décadas. Naquela época, extremistas hutus perpetraram um massacre contra tutsis e hutus moderados, antes de serem destituídos pelas forças tutsis sob liderança de Kagame. Ruanda alega que alguns dos responsáveis pelo genocídio se refugiaram no Congo, juntando-se a milícias que possuem vínculos com o governo congolês e que representam uma ameaça tanto para os tutsis congoleses quanto para a própria Ruanda.
O governo congolês rejeita as acusações de Ruanda e afirma que o país vizinho utiliza essas milícias para controlar e explorar minerais valiosos, como o coltan, que é utilizado na fabricação de smartphones. Na capital congolense, Kinshasa, a 1.600 quilômetros a oeste de Goma, manifestantes atacaram instalações da ONU e diversas embaixadas, incluindo as de Ruanda, França, Estados Unidos e Brasil, expressando ir indignação com o que consideram interferência externa.