A Niantic anunciou recentemente uma transformação significativa em sua estratégia, mudando seu foco de desenvolvimento de jogos para a criação de ferramentas de inteligência artificial. A empresa, conhecida por seu sucesso com Pokémon Go, vendeu sua divisão de desenvolvimento de jogos para a empresa saudita Scopely, em um acordo que alcançou o montante de US$ 3,5 bilhões. A nova identidade da Niantic, agora chamada Niantic Spatial, enfatiza sua nova direção, que envolve o desenvolvimento de modelos de IA voltados para a análise do mundo real, em vez de se concentrar em jogos de realidade aumentada.
A Niantic está investindo fortemente em sua plataforma Spatial, que foi lançada em novembro e oferece ferramentas de mapeamento baseadas em IA. Essas ferramentas visam auxiliar empresas na formulação de rotas para robôs e em aplicações de realidade aumentada. A empresa também aposta no uso de Grandes Modelos Geoespaciais (LGMs), que permitem à inteligência artificial compreender e interagir com o ambiente físico de forma semelhante a um humano. Esses modelos são alimentados por um vasto conjunto de dados de localização, extraídos da experiência coletiva de bilhões de quilômetros percorridos por jogadores de seus jogos.
A transformação da Niantic reflete as mudanças profundas provocadas pelo avanço da IA generativa no Vale do Silício, especialmente após o surgimento do ChatGPT. Segundo previsões, o mercado de computação espacial poderá alcançar US$ 1,7 trilhão até 2033, um crescimento substancial em comparação aos US$ 110 bilhões de 2023. Essa expansão terá como impulso as soluções de localização oferecidas por empresas como TomTom e grandes players do setor, como o Google.
A Niantic enfrenta uma competição acirrada no setor de IA espacial. A Nvidia, por exemplo, possui uma plataforma chamada Omniverse, que cria gêmeos digitais em 3D para simulações em diversos ambientes. Além disso, a fundadora da startup World Labs, Fei-Fei Li, reconhecida por suas contribuições em visão computacional, está desenvolvendo IA que cria mundos 3D, um recurso útil para jogos e simulações.
Para manter sua nova direção, a Niantic assegurou um investimento de US$ 250 milhões de seus investidores atuais, incluindo Coatue e Battery Ventures. Como parte do acordo, cerca de 400 funcionários da área de jogos se juntarão à Scopely, enquanto aproximadamente 200 permanecerão com a Niantic. Durante essa reestruturação, a empresa demitiu mais de 65 funcionários, embora não preveja desligamentos significativos no futuro próximo.
Pokémon Go, lançado em 2016, se revelou um sucesso financeiro significativo, gerando cerca de US$ 8 bilhões em receita. Desde então, o jogo acumulou mais de 100 milhões de jogadores em 2024. Embora a Niantic continue a produzir outros jogos, a maior parte de sua receita ainda provém de Pokémon Go, e analistas estimam que o jogo foi responsável por aproximadamente US$ 770 milhões da arrecadação no ano passado.
Embora a Niantic tenha alcançado grande sucesso inicialmente, sua trajetória posterior foi marcada por desafios. Jogos como Harry Potter: Wizards Unite não alcançaram o mesmo nível de popularidade e foram descontinuados. A empresa enfrentou cortes de pessoal significativos e o cancelamento de vários projetos promissores.
O principal argumento da Niantic para essa reestruturação é a concentração de foco. Historicamente, houve competição interna por recursos entre o desenvolvimento de jogos e as tecnologias que sustentam a realidade aumentada. Com a divisão, a Niantic espera dedicar-se inteiramente ao setor corporativo.
O reposicionamento da Niantic é também uma parte de sua história, já que foi fundada por John Hanke, um pioneiro no mapeamento digital. A empresa inicialmente surgiu dentro da Google, lançando jogos de sucesso como Ingress e Pokémon Go, antes de se tornar independente.
A nova estratégia da Niantic busca oferecer suas tecnologias aos setores corporativos, como o sistema de posicionamento visual, que pode ajudar em processos logísticos e inspeções remotas. A empresa já iniciou parcerias, utilizando sua tecnologia em projetos como um tour de realidade aumentada em Singapura.
Além disso, a Niantic mantém acordos com outras empresas, como a Booz Allen Hamilton, para integrar suas ferramentas de mapeamento e logística. Não se descarta a possibilidade de trabalhar com entidades governamentais, incluindo potenciais clientes militares, sem, no entanto, entrar no ramo de fabricação de armas.
Os dados gerados pelo Pokémon Go continuam sendo um ativo valioso. Apesar da venda da divisão de jogos, a Niantic ainda fornece serviços de mapeamento para a Scopely, mantendo acesso aos dados de localização essenciais para o desenvolvimento de seus modelos de IA.
Contudo, a venda e o uso dos dados gerados pelo jogo suscitaram preocupações sobre privacidade. Hanke negou que os dados dos jogadores fossem utilizados sem consentimento e garantiu que a empresa se compromete a respeitar as leis de privacidade.
Após o fechamento do negócio, a Niantic celebrou a nova fase em sua trajetória em uma festa, sinalizando a transição de sua divisão de jogos para a nova era de IA. Os funcionários da unidade de jogos se mudarão para um escritório da Scopely próximo à sede da Niantic, mantendo um vínculo próximo mesmo após a reestruturação completa.
