Em 2005, o Congresso Nacional formou uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para investigar alegações de corrupção nos Correios, após um funcionário da empresa ser flagrado recebendo subornos e detalhando um esquema de corrupção em nível governamental. A estrutura revelada envolvia partidos políticos que, em troca de apoio, recebiam cargos importantes na administração federal, utilizando-os para extorquir empresários e prestadores de serviços. As investigações desvelaram um dos mais graves escândalos de corrupção da época, onde parlamentares eram subornados para aprovar iniciativas que favoreciam o governo. O então presidente, Luiz Inácio Lula da Silva, estava em seu terceiro ano de mandato. O escândalo conhecido como mensalão resultou na prisão de diversos ministros, parlamentares, líderes partidários, empresários e banqueiros. Passadas duas décadas, a oposição acredita estar em condições de reviver situações semelhantes.
Recentemente, o senador Márcio Bittar (União Brasil-AC) protocolou um pedido para a criação de uma nova CPI dos Correios. O objetivo declarado é investigar supostas irregularidades na gestão da empresa, que teriam gerado um prejuízo de 3,2 bilhões de reais no último ano. Entre os problemas citados por Bittar, não há informações que lembrem as gravações que marcaram o escândalo anterior. Porém, o senador acredita que auditorias nas contas da estatal, sob a presidência de Fabiano Silva dos Santos, possam revelar informações significativas. Desde que assumiu o cargo, Santos, indicado por um grupo de advogados alinhado ao governo, implementou mudanças na administração, mas os resultados financeiros têm sido insatisfatórios. A empresa não registrava lucro desde 2021, durante o governo de Jair Bolsonaro, quando obteve um ganho de 3,7 bilhões de reais.
Os Correios empregam aproximadamente 85 mil pessoas, possuem 10.472 agências em operação e geraram cerca de 20,1 bilhões de reais em receitas em 2024. Paradoxalmente, senadores da oposição acusam a gestão de Santos pelos maus resultados da empresa, atribuindo-os a decisões erradas e práticas questionáveis. Bittar destaca que o funcionamento de uma CPI poderia esclarecer a razão pela qual os Correios desistiram de contestar uma ação trabalhista resultando em um pagamento de 614 milhões de reais. Outras decisões polêmicas incluiriam um acordo pelo qual os Correios assumiram um débito de 7,6 bilhões de reais do Postalis, fundo de pensão dos empregados, o que levantou suspeitas sobre taxas milionárias cobradas pelo escritório de advocacia envolvido, que anteriormente contava com Santos como sócio. Santos, por sua vez, nega qualquer irregularidade e afirma ter se afastado do escritório em novembro de 2022, antes de assumir a presidência da estatal.
A iniciativa da oposição de investigar os Correios foi respaldada pelo ex-presidente Jair Bolsonaro, que durante seu governo tentou privatizar a empresa. Bolsonaro tem disseminado denúncias recebidas sobre a gestão atual da estatal. O senador Bittar enfatizou que a situação do patrimônio público exige atenção e ação do Congresso, com pressões para que a presidência do Senado, a cargo de Davi Alcolumbre (União Brasil-AP), instale a CPI. No entanto, os aliados de Bolsonaro reconhecem a dificuldade de persuadir Alcolumbre, que busca manter boas relações com Lula. Para aumentar a pressão, Bittar foi aconselhado a buscar apoio político para a criação da comissão, considerando o potencial de uma maioria conservadora no Senado após as eleições de 2026.
Conforme as regras do Senado, é permitido o funcionamento simultâneo de até cinco CPIs. Atualmente, apenas duas estão em operação — uma investigando manipulação em apostas esportivas e outra nos impactos dessas apostas nas finanças familiares. Caso a presidência do Senado se oponha à instalação da CPI, existe a possibilidade de recorrer ao Supremo Tribunal Federal, criando um cenário interessante, devido a eventos passados em que a instalação de CPIs foram contestadas. Em 2021, uma ação do senador Alessandro Vieira (MDB-SE) sobre a CPI da Covid resultou na autorização do STF, reafirmando os direitos das minorias parlamentares no controle democrático.
A CPI que apurou a corrupção nos Correios há 20 anos começou em meio a um escândalo que quase levou à ruína o governo de Lula e causou sérios danos à imagem do Partido dos Trabalhadores. Essa história estimula a oposição a formular estratégias para estabelecer a nova comissão, embora a principal pareça ser reavivar o debate sobre a privatização da empresa, suspensa pelo governo atual por questões de natureza ideológica. Qualquer deterioração política do governo é vista como um aspecto adicional que poderá ser explorado, uma vez que questões em torno do fundo de pensão dos funcionários têm sido fontes de polêmica sem esclarecimentos satisfatórios.
Entre os tópicos que os senadores pretendem investigar, destaca-se uma decisão tomada pela direção dos Correios, que autorizou um pagamento de gratificação de 2.500 reais a todos os funcionários, mesmo quando a empresa já reconhecia uma situação de insolvência. Esse bônus, apelidado de “vale-peru”, teve um custo total de 200 milhões de reais. A responsabilidade pelo pagamento dessas despesas recai sobre a própria estatal e seus controladores.
O presidente dos Correios, Fabiano Silva dos Santos, comentou sobre o movimento da oposição no Senado em busca de instaurar uma nova CPI. Santos defende que não há quaisquer irregularidades nas contas da empresa, apresentando dados sobre a maturidade na gestão de riscos que indicam um avanço significativo. Afirmou também que sua relação com o escritório de advocacia envolvido na gestão da dívida com o Postalis é infundada e ressaltou a trajetória de investimentos e reestruturações que a estatal atualmente enfrenta, buscando recuperar sua estabilidade e fortalecer suas operações.
O advogado esclareceu que a falta de investimentos em períodos anteriores foi uma das causas dos desafios financeiros enfrentados pela empresa. A recuperação dos Correios é considerada um processo demorado, porém a administração atual se empenha em diversificar as operações e realizar investimentos em áreas estratégicas, como logística de saúde e iniciativas de inclusão financeira. Santos defendeu a importância dos Correios como um serviço essencial, especialmente em regiões onde o setor privado não atua, garantido o direito das comunidades mais distantes ao acesso a serviços básicos de entrega e comércio.