Iman Helles, uma mãe desabrigada em uma instalação gerida pela agência da ONU destinada a refugiados palestinos em Gaza, teme que ela e seus três filhos possam ser “jogados na rua”. A proibição imposta por Israel à agência para refugiados palestinos, a UNRWA, entrou em vigor na quinta-feira (30), e Helles depende quase que inteiramente da organização para sustentar sua família na região devastada. Após a destruição de sua casa no bairro de Shejaiya, na parte leste da Cidade de Gaza, eles se mudaram para uma antiga escola primária feminina que agora funciona como abrigo administrado pela UNRWA em Deir al-Balah, no centro de Gaza.
O governo da Inglaterra, França e Alemanha criticaram a restrição imposta por Israel à UNRWA, enquanto a União Europeia anunciou a retomada de sua missão na fronteira de Rafah, informa o chefe da política externa. Um ataque israelense resultou na morte de duas pessoas no Líbano em meio a um cessar-fogo em vigor. “Estamos vivendo em uma escola da agência. Se a agência for proibida, não teremos comida nem água”, expressou Helles. Ela questiona: “Se nos expulsarem, para onde irei com meus filhos pequenos?” Helles faz parte de um imenso número de palestinos que dependem da UNRWA para acesso à alimentação, educação e meios de subsistência, tanto em Gaza quanto na Cisjordânia e em Jerusalém Oriental, que estão sob ocupação israelense.
Em outubro, o Knesset, parlamento israelense, aprovou duas leis que proíbem a UNRWA de atuar em Israel e restringem as autoridades israelenses de se comunicarem com a agência. A segunda dessas leis revoga um tratado firmado em 1967 que permitia à UNRWA oferecer serviços a refugiados palestinos em áreas controladas por Israel. Com a implementação da legislação na quinta-feira, as atividades da UNRWA deverão ser severamente limitadas, o que poderá causar um impacto humano significativo e devastador.
Israel tem tentado desmantelar a agência há anos, mas intensificou suas ações após os ataques realizados por militantes do Hamas no dia 7 de outubro de 2023, que resultaram em 1.200 mortes e mais de 250 reféns. Israel acusou alguns funcionários da UNRWA de envolvimento com esses ataques. Uma investigação da ONU indicou que nove dos 13 mil funcionários da UNRWA em Gaza “podem” ter participado do ataque e não devem mais trabalhar na agência. Entretanto, a UNRWA tem insistido que Israel não apresentou provas contra seus ex-funcionários. A agência afirma que sempre forneceu a Israel uma lista abrangente de seus funcionários e acusou Israel de detê-los e torturá-los, forçando-os a confessar falsamente qualquer ligação com o Hamas.
Ainda não está claro como Israel planeja conduzir a proibição, mas seus efeitos já começaram a se manifestar. Domingo, Israel ordenou que a UNRWA “desocupasse todas as instalações em Jerusalém Oriental ocupada e cessasse suas atividades até o dia 30 de janeiro de 2025”, de acordo com a agência da ONU. Além disso, Israel reduziu a validade dos vistos da equipe internacional da UNRWA, informando que isso “equivale a despejo”. Um porta-voz da UNRWA a classificou como uma situação crítica. “A equipe internacional da UNRWA em Jerusalém Oriental teve que evacuar para Amã, capital da Jordânia, no início do dia”, declarou a ONU. Os equipamentos e veículos do escritório foram movidos, e continuam os esforços para digitalizar os arquivos existentes.
Poucos dias antes da proibição, a ONU emitiu alertas sobre as repercussões negativas que isso poderia ter, enquanto Israel alegou que a agência é substituível e comprometeu-se a garantir a continuidade do fluxo de ajuda para Gaza. O líder da UNRWA, Philippe Lazzarini, afirmou que a implementação dessa proibição será “desastrosa”. “O governo de Israel alega que os serviços da UNRWA podem ser repassados a outras entidades”, disse Lazzarini, enfatizando que a UNRWA tem uma função única que não pode ser transferida a menos que haja um estado funcional.
Em discurso na ONU, o representante israelense argumentou que “essa legislação é sobre o que acontece em Israel; não está relacionada ao que ocorre em Gaza, na Jordânia ou no Líbano”. Ele também afirmou que a UNRWA deve ser eliminada em Gaza e substituída por outras agências da ONU, prevendo um processo gradual para que isso ocorra. O porta-voz do governo israelense mencionou que algumas dessas agências incluirão o Programa Mundial de Alimentos (PMA), a UNICEF e o UNOPS, que operam em Gaza. Essas agências trabalharam em estreita colaboração com a UNRWA e tanto o PMA quanto a UNICEF já expressaram suas reservas em relação à proibição imposta à sua parceira da ONU.
Mais de 912.000 refugiados palestinos estão registrados na UNRWA na Cisjordânia e em Jerusalém Oriental, com cerca de 25% vivendo em 19 campos de refugiados. Na Cisjordânia, a UNRWA atende mais de 45.000 alunos e opera aproximadamente 96 escolas, 43 centros de saúde e 19 centros destinados a mulheres. Além disso, a agência forneceu empréstimos que totalizam 225,3 milhões de dólares. Israel, por sua vez, sustenta que a contribuição da UNRWA é mínima e que os palestinos não ficarão sem ajuda, uma afirmação que é contestada pela UNRWA e por outras agências da ONU.
As outras agências de ajuda “não terão alternativa senão continuar e ampliar seus esforços”, disse Danon. A segurança dos trabalhadores da UNRWA também se tornará uma preocupação, dado que mais de 270 já foram mortos desde o início do conflito, segundo a agência. O Ministério da Saúde de Gaza relatou que mais de 47.000 palestinos foram mortos devido ao cerco imposto por Israel. Quando perguntado sobre a segurança da equipe da UNRWA, Danon respondeu que “não é nossa responsabilidade cuidar da segurança deles”. Mencer, por sua vez, classificou a UNRWA como “uma instituição falida” e a acusou de perpetuar o conflito, alegando que “glorifica a matança de judeus e promove a jihad”.
Hoda Hussein, que foi deslocada de sua casa no norte de Khan Younis, descreveu a proibição imposta à UNRWA como “uma segunda fome e uma nova guerra em Gaza”. “Confiamos em Deus e, em seguida, neles (da UNRWA)”, afirmou, acrescentando que estão sem opções há 15 meses. “Confiamos neles completamente, para tudo”.