Um estudo realizado no Brasil apresentou resultados positivos na aplicação de microrganismos para a degradação de plásticos e na produção de bioplásticos, além de aprimorar o entendimento sobre as enzimas e os caminhos bioquímicos envolvidos. As informações completas foram publicadas no periódico Science of The Total Environment. Após a crise climática, a poluição por plásticos tornou-se um dos desafios ambientais mais urgentes, com cerca de 350 milhões de toneladas de plástico descartadas anualmente. Deste volume, aproximadamente 40% são relacionados a embalagens. Esses dados foram extraídos de um levantamento do Credit Suisse.
Apesar da reciclagem ser uma alternativa ao problema plástico, ela não é eficaz como solução definitiva. “Esse processo não resolve a questão, pois frequentemente gera novos plásticos com qualidades inferiores, que acabam sendo jogados fora após seu uso”, explica Fábio Squina, professor da Universidade de Sorocaba (Uniso) e coordenador da pesquisa, que contou com a colaboração das universidades Estadual de Campinas (Unicamp) e Federal do ABC (UFABC).
Os cientistas, por meio de amostras de solo poluído por plásticos, conseguiram criar comunidades microbianas que conseguem degradar materiais como polietileno (PE) e tereftalato de polietileno (PET). A análise metagenômica dessas comunidades resultou na identificação de novos microrganismos e enzimas ligadas à degradação de polímeros.
Um dos avanços significativos foi a criação de uma linhagem de Pseudomonas sp, denominada BR4, que não só degrada o PET, mas também produz polihidroxibutirato (PHB), um bioplástico de alta qualidade. Este material, uma vez enriquecido com hidroxivalerato (HV), oferece maior flexibilidade e resistência em comparação ao PHB puro, tendo potencial para ser utilizado na fabricação de embalagens sustentáveis e em aplicações biomédicas. “Para alcançar esses resultados, sequenciamos os genomas de 80 bactérias presentes nas comunidades microbianas, reconhecendo espécies já conhecidas e novas, ligadas à degradação de plásticos. Também avaliamos o potencial genético de cada uma para codificar enzimas relacionadas a este processo”, revela Squina.
O estudo ainda fez um mapeamento dos transportadores e das vias metabólicas relacionadas à degradação e assimilação de polímeros plásticos. “As comunidades microbianas mostraram características impressionantes, degradando polímeros através de interações cooperativas entre bactérias e caminhos bioquímicos especializados”, destaca o pesquisador.
Financiada pela FAPESP com 13 projetos, a pesquisa demonstrou o potencial das abordagens ômicas em comunidades microbianas como uma plataforma valiosa para a descoberta de novas enzimas e microrganismos que podem converter plásticos derivados do petróleo em biopolímeros. O estudo também sugere que as plataformas utilizadas podem ser aplicadas a uma variedade de plásticos, ampliando os benefícios da tecnologia. “Estamos investigando métodos para aprimorar, no nível bioquímico, enzimas e microrganismos para lidar com plásticos mais resistentes que o PET”, menciona Squina.
Ele acrescenta que, “além de gerar bioplásticos, esses microrganismos podem ser utilizados na produção de outros compostos químicos relevantes para os setores de agricultura, cosméticos e alimentação”. Contudo, enfatiza que são necessárias mais pesquisas para confirmar essas descobertas em condições do mundo real e para otimizar o uso dos microrganismos.
Um estudo do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma) revelou que os plásticos representam 85% dos resíduos que vão para os oceanos, e os volumes de plásticos que chegam ao mar devem quase triplicar até 2040, colocando em risco todas as espécies que dependem dos ecossistemas marinhos, desde plâncton e moluscos até aves, tartarugas e mamíferos. Corais, manguezais e ervas marinhas também podem ser sufocados por detritos plásticos, que bloqueiam a entrada de oxigênio e luz. Outro problema crescente é a poluição por microplásticos, que afeta solos, águas e o ar, podendo se acumular nos órgãos humanos.
Enquanto os governos ainda hesitam em tomar medidas efetivas para combater essa situação, de maneira semelhante ao que ocorre com a crise climática, a comunidade científica continua em busca de soluções. O estudo mencionado contribui significativamente para essa busca.