Para promover a igualdade no consumo de clientes negros, o Movimento pela Equidade Racial (Mover) e a rede de advogadas negras Black Sisters in Law estabeleceram o “Código de Defesa e Inclusão do Consumidor Negro”. Este documento apresenta dez propostas voltadas para a erradicação de práticas racistas e discriminatórias em lojas e estabelecimentos comerciais, com o intuito de proporcionar uma experiência de consumo mais justa.
A criação do código foi inspirada em uma pesquisa realizada pelo estúdio NINA, envolvendo consumidores negros das classes A e B, que evidenciou a prevalência do racismo em estabelecimentos de varejo. Os dados revelam que 91% dos consumidores negros já enfrentaram discriminação em lojas de beleza e moda de luxo; 70% relataram um desconforto frequente ao se relacionar com esses ambientes; e 18% foram seguidos, revistados ou tiveram suas bolsas inspecionadas. As normas sugeridas incluem a capacitação obrigatória de funcionários em questões antirracistas, para eliminar preconceitos conscientes e inconscientes; o atendimento prioritário a consumidores negros como forma de reparar exclusões; a garantia de acesso livre em espaços comerciais; e a regulamentação para abordagens e revistas, que devem ocorrer somente com provas claras, visando a redução de estigmas baseados em estereótipos raciais.
O código também traz diretrizes específicas para o setor de higiene e beleza, demandando a disponibilidade de produtos adequados para peles negras e cabelos crespos e cacheados, atendendo a uma necessidade histórica de representatividade nas prateleiras. A iniciativa conta com o apoio da ALLOS, que administra 56 shoppings no Brasil, e da Associação Brasileira de Perfumarias Seletivas (ABPS), ambos comprometidos em divulgar o documento entre seus parceiros e associados. A implementação das diretrizes será iniciada por grandes redes no próximo semestre.
Durante o lançamento do código, diversas personalidades, como Lázaro Ramos e Conceição Evaristo, estiveram presentes, marcando simbolicamente o início de uma mobilização importante. A diretora executiva do MOVER, Natália Paiva, ressaltou a relevância da ação coletiva para promover mudanças estruturais no segmento. A jurista Dione Assis, fundadora do Black Sisters in Law e idealizadora do código, esclareceu que o intuito do documento não é substituir o Código de Defesa do Consumidor, mas sim complementá-lo com uma perspectiva afrocentrada. Segundo Assis, “o código é importante porque aborda o racismo nas relações de consumo não apenas de maneira escassa, mas na lógica da prosperidade”. Embora não possua efeito jurídico vinculativo, o documento detém um significativo valor moral e simbólico.
A escritora e intelectual Conceição Evaristo reforçou a importância desse aspecto simbólico, lembrando a falta de representatividade histórica no mercado de beleza. “Por muito tempo, nós, pessoas negras, não nos vimos representadas na beleza brasileira. Estética sempre foi política — e sermos considerados belos é um ato de afirmação. Hoje, ver uma juventude negra se reconhecendo como parte essencial da identidade brasileira e tendo acesso a produtos que celebram sua beleza é, para mim, uma conquista simbólica e histórica.”