20 fevereiro 2025
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Sensor Revolucionário Inspira-se na Luz de Vaga-Lume para Monitorar Alterações Celulares

O gene responsável pela codificação de uma enzima de vagalume, identificado no campus de Sorocaba da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), resultou em um biossensor inovador. Este dispositivo é capaz de detectar variações de pH em células de mamíferos, o que pode ser benéfico para pesquisas sobre doenças e para a avaliação da toxicidade de possíveis fármacos. A luciferase da espécie Amydetes vivianii apresenta uma mudança de cor que varia do verde-azulado ao amarelo e vermelho conforme a acidez diminui em fibroblastos, que são as células predominantes no tecido conjuntivo. Este resultado é alcançado com grande intensidade e estabilidade, características que não haviam sido obtidas com outras luciferases avaliadas anteriormente pela equipe de pesquisa.

O estudo, que recebeu apoio da FAPESP, foi publicado na revista Biosensors. As luciferases são enzimas presentes em organismos bioluminescentes que emitem luz ao oxidar a luciferina, um composto essencial para o processo. A luciferase em questão foi extraída de uma espécie descoberta em 2006 pelo coordenador do estudo, Vadim Viviani, que lidera o Laboratório de Bioquímica e Tecnologias Bioluminescentes da UFSCar. Em 2011, sua equipe conseguiu clonar a enzima.

Dentro das células, as alterações de pH podem sinalizar uma variedade de processos, incluindo homeostase, proliferação e morte celular. A técnica desenvolvida possui potencial aplicações na investigação de doenças e na análise da toxicidade de fármacos. Essa afirmação é sustentada por Vanessa Bevilaqua, primeira autora do artigo e pós-doutoranda na Faculdade de Ciências Médicas e da Saúde da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP).

As pesquisas foram realizadas sob a coordenação de Viviani, na UFSCar, e de Eliana Duek, na PUC-SP, com o suporte da FAPESP. Comparado a outras luciferases testadas, que apresentavam uma emissão luminosa avermelhada e alterações de cor limitadas em 36°C – temperatura na qual as células de mamíferos operam – o novo modelo foi otimizado para uma expressão mais eficiente em células mamíferas. Isso resultou em uma mudança na cor da luz maior, estabilidade aprimorada e um brilho intenso.

Em experimentos conduzidos pelo grupo, além de capturar imagens da bioluminescência em câmeras de fotodetecção, foi possível registrar a luz emitida pelas luciferases em células de mamíferos utilizando a câmera de um smartphone. O brilho se manteve intenso nos primeiros 30 minutos e, mesmo com uma redução progressiva, foi detectável por pelo menos 12 horas, embora esse último indício exigisse um equipamento avançado de fotodetecção.

A cor da luz emitida pode ser utilizada para indicar o pH dentro das células, incluindo as humanas, permitindo deduzir se há estresse celular ou outros efeitos associados à acidez. Este é um feito pioneiro desenvolvido inteiramente no Brasil. A pesquisa faz parte do projeto “Desenvolvimento de insumos bioluminescentes para imunoensaios, análises ambientais e bioimagem”, novamente apoiado pela FAPESP e dirigido por Viviani. Os coautores incluem Gabriel Pelentir, doutorando na UFSCar, e Moema Hausen, professora da PUC-SP.

Em investigações anteriores, a equipe já tinha explorado a aplicação da luciferase de outro vagalume do gênero Macrolampis para monitorar o pH em células bacterianas. No entanto, ao ser aplicada em células mamíferas, a bioluminescência da luciferase de Macrolampis apresentava uma coloração excessivamente avermelhada e era pouco responsiva às mudanças de pH, além de não manter a estabilidade necessária acima de 36°C, reduzindo sua eficiência para esse tipo de célula.

Durante a pandemia, o grupo de Viviani desenvolveu um imunoensaio baseado na luciferase de Amydetes vivianii, capaz de detectar a COVID-19 ao brilhar em contato com anticorpos contra o SARS-CoV-2. Com a conclusão desta pesquisa, o laboratório de Viviani, já estabelecido como referência em bioluminescência, ampliou sua capacidade para realizar testes bioluminescentes em células de mamíferos. Isso permite tanto novos estudos com a luciferase quanto a avaliação de outras enzimas que fazem parte do acervo do laboratório, acumulado ao longo de mais de 30 anos por meio de pesquisas com insetos brasileiros.

Esses avanços comprorometem-se a abrir novas possibilidades, abrangendo desde bioensaios para testar a toxicidade de fármacos e produtos cosméticos, até aplicações no estudo dos efeitos de biomateriais em células humanas e novas abordagens para investigar células cancerígenas.

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