Por 8 votos a 3, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que a Lei Maria da Penha pode ser aplicada a casais homoafetivos. O julgamento ocorreu no plenário virtual, onde os ministros expressam seus votos por meio de uma plataforma online, sem a exigência de uma sessão presencial. O processo começou a ser analisado no dia 14 de fevereiro e foi finalizado em 21 de fevereiro.
O relator do caso, ministro Alexandre de Moraes, destacou que a falta de uma norma que amplie a proteção da Lei Maria da Penha a casais homoafetivos masculinos e a mulheres transexuais e travestis poderia criar uma lacuna na proteção e punição de casos de violência doméstica. Conforme um relatório recente do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), o homicídio foi o crime mais frequentemente identificado contra travestis e gays no Brasil, atingindo 80% e 42,5%, respectivamente. Para lésbicas, os crimes mais comuns foram lesão corporal (36%) e injúria (32%), enquanto mulheres trans foram, em maior quantidade, vítimas de crimes de ameaça (42,9%).
Em seu voto, Moraes argumentou que poderia agravar a condição do homem como vítima de violência em casais homoafetivos, especialmente se ele se encontrasse em posição de subalternidade na relação. O ministro ressaltou que a identidade de gênero é um aspecto importante da personalidade humana, englobando direitos à identidade, intimidade, privacidade, liberdade e tratamento igualitário, todos protegidos pela dignidade da pessoa humana.
No que diz respeito a transexuais e travestis, o relator afirmou que a expressão “mulher” na lei se aplica tanto ao sexo feminino quanto ao gênero feminino, reconhecendo que a conformação física visual é apenas uma das muitas características que definem o gênero. Moraes enfatizou a obrigação do Estado em proteger os cidadãos de agressões e a necessidade de implementar medidas preventivas para combater a violência no contexto familiar.
Os ministros Luís Roberto Barroso, Flávio Dino, Gilmar Mendes, Dias Toffoli, Cármen Lúcia, Nunes Marques e Luiz Fux acompanharam o relator. Os ministros Cristiano Zanin, André Mendonça e Edson Fachin também concordaram com a extensão da lei, mas levantaram a ressalva sobre a impossibilidade de aplicação de penalidades cuja tipificação dependesse da condição da vítima como mulher. Esses três foram votos vencidos na decisão.
A Lei Maria da Penha foi sancionada em 2006 pelo então presidente Luiz Inácio Lula da Silva e é considerada um marco importante na proteção dos direitos das mulheres no Brasil. A lei foi nomeada em homenagem a Maria da Penha Maia Fernandes, uma farmacêutica que sobreviveu a uma tentativa de homicídio por parte de seu ex-marido e lutou por anos para a punição do agressor, que a deixou com sequelas graves. A legislação estabelece diversas medidas de proteção às vítimas de violência, incluindo a criação de juizados especiais, a concessão de medidas protetivas de urgência e a garantia de assistência às vítimas.