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A principal instância judicial do país, o Supremo Tribunal Federal, sempre teve um papel representativo entre os três poderes da República, mas sua relevância era sutil no início do ciclo democrático pós-regime militar. Com os julgamentos do mensalão e da Lava-Jato, a Corte ganhou destaque nos anos 2000, colocando seus ministros no centro do debate público e, como consequência, frequentemente se envolvendo na batalha política. O crescimento de seu protagonismo gerou críticas sobre “ativismo judicial” e a suposta intromissão em atribuições de outras esferas, culminando em quase crises institucionais. No entanto, para aqueles que acreditam que esse protagonismo da Corte deve diminuir, a agenda de 2025 sugere uma direção oposta.
A agenda do Supremo está repleta de temas que podem provocar debates intensos, tanto políticos quanto sociais e econômicos. Entre as questões mais relevantes estão o julgamento do ex-presidente Jair Bolsonaro, do general Walter Braga Netto e outras 38 pessoas ligadas à tentativa de golpe de Estado. A proposta de regras de transparência para emendas parlamentares, defendida pelo ministro Flávio Dino, também promete gerar discussões acaloradas. O primeiro caso pode reacender a indignação dos apoiadores de Bolsonaro em relação à Corte, intensificando ainda mais a polarização política que tem marcado os últimos anos. Já a proposta de transparência pode desencadear um conflito institucional com o Congresso, que já está se gestando desde o final de 2024.
Outro aspecto que vai além da esfera política envolve temas que impactam o cotidiano da população. As diretrizes para as redes sociais também estão entre essas questões delicadas. O STF está avaliando a responsabilidade das plataformas em relação ao conteúdo publicado por usuários. Dois casos semelhantes estão sendo analisados em conjunto: um deles, sob a relatoria de Luiz Fux, trata de um recurso do Google, que foi condenado a indenizar uma professora por publicações ofensivas feitas contra ela no Orkut. O outro, sob a relatoria de Dias Toffoli, diz respeito ao Facebook, que teve que ressarcir uma vítima de um perfil falso. Três ministros já sinalizaram a favor da revogação do artigo 19 do Marco Civil da Internet, que isenta as plataformas de responsabilidade desde 2014. Essa mudança representa um desafio para empresas gigantes como a Meta e o X, que já adotaram políticas semelhantes. Outros ministros demonstraram que também podem apoiar essa revogação. O julgamento foi adiado recentemente, e espera-se que novas divergências surjam, o que pode acirrar ainda mais os ânimos no tribunal.
O julgamento das ações que contestam a regulamentação das apostas também promete ser polêmico. Esse setor movimentou R$ 138 bilhões em 2024 e pode enfrentar nova ilegalidade, dependendo da decisão do STF. Após um longo período sem regulamentação, o governo conseguiu implementar um novo marco regulatório, que já está em vigor para 138 empresas que cumpriram as exigências. Contudo, duas ações judiciais questionam a constitucionalidade dessa regulamentação. O relator, Luiz Fux, já indicou que mudanças estão por vir, incluindo a proibição de propagandas direcionadas a crianças e adolescentes e restrições ao uso de recursos do Bolsa Família nas apostas. Essa última decisão gerou uma série de críticas, levantando preocupações sobre a capacidade do governo de monitorar como os cidadãos gastam seu dinheiro. “É inviável operacionalizar esse controle”, afirma um especialista do setor.
Os aplicativos de transporte e de entrega, como Uber e iFood, também estão atentos ao que o STF decidirá sobre o vínculo trabalhista dos motoristas. O relator, Edson Fachin, realizou audiências públicas para fundamentar sua decisão. O desfecho desse processo poderá estabelecer precedentes, já que ganhou a relevância de repercussão geral. O caso, que envolve um recurso da Uber, atraiu a atenção de diversos intervenientes interessados, incluindo sindicatos e associações empresariais, refletindo a complexidade das relações de trabalho nessa área. A questão do vínculo empregatício enfrenta resistência tanto de empresas quanto de segmentos da própria categoria de motoristas, o que levanta preocupações sobre a segurança jurídica gerada pelas decisões do STF.
No contexto de crescente influência, o STF também assumirá funções que vão além do seu papel tradicional, como o julgamento de casos de assassinatos, incluindo o da vereadora Marielle Franco. Nesse caso específico, os acusados serão julgados no Supremo devido a um deles ter foro privilegiado. A denúncia foi apresentada pelo procurador-geral da República e refletiu uma federalização do inquérito. Além disso, um dos recursos ligados a essa causa envolve a legalidade da quebra de sigilos, que toca em questões de privacidade, especialmente por estar ligada ao interesse de grandes empresas de tecnologia.
O fortalecimento do STF, que se intensificou desde a promulgação da Constituição de 1988, faz com que a Corte atue em uma variedade de temas que poderiam ser discutidos pelo Legislativo. Especialistas acreditam que as questões referentes à regulamentação das apostas, a legislação das redes sociais e a transparência das emendas deveriam ser resolvidas pelo Parlamento. Conforme a polarização política se intensificou, o poder do Supremo também cresceu, refletindo a dificuldade de construção de consensos nas instituições políticas. Para os críticos, essa tendência evidencia a necessidade de repensar o papel do STF, que, como observa o presidente Luiz Roberto Barroso, lida com questões que, em outros países, pertenceriam à esfera política, mas que no Brasil foram incorporadas à Constituição.
Além da complexa agenda, o STF enfrentará uma mudança significativa em sua administração. Edson Fachin assumirá a presidência em setembro, sucedendo Barroso, que enfatizou a importância de respeitar os limites constitucionais em sua gestão. Fachin, conhecido por seu foco na autocontenção, tem a responsabilidade de guiar a Corte em um período de testes que obrigará a Justiça a se reafirmar como guardiã da democracia e do Estado de Direito, enquanto lida com os desafios que surgem em um cenário político conturbado.