Os tubarões são frequentemente considerados predadores silenciosos dos oceanos, conhecidos pela sua natureza furtiva e eficiência na caça. No entanto, um estudo recente revelou que uma espécie específica de tubarão, o cação-pintado-de-estuário (Mustelus lenticulatus), pode ser mais vocal do que se imaginava, produzindo sons que se comparam ao estourar de um balão. Esta pesquisa, publicada na revista Royal Society Open Science, marca a primeira vez que cientistas registram evidências dessa produção ativa de som, que ocorre quando os tubarões batem seus dentes.
De acordo com especialistas, a comunicação entre tubarões era tradicionalmente pensada como algo que ocorria principalmente através da linguagem corporal e sinais químicos, permanecendo, em grande parte, um mistério. A descoberta abre novas possibilidades sobre a comunicação sonora entre essas criaturas marinhas. O cação-pintado-de-estuário é uma espécie de pequeno porte que habita as águas costeiras da Nova Zelândia, vivendo geralmente próximo ao fundo do mar e desempenhando um papel importante na indústria pesqueira local.
Diferentemente de outros peixes que possuem uma bexiga natatória, um órgão que facilita a flutuação e a produção de som, os tubarões não possuem essa característica, o que torna a produção de sons uma novidade. A principal autora do estudo, Carolin Nieder, despertou seu interesse pelas capacidades acústicas dos tubarões após ouvir um som de clique inesperado durante experimentos de treinamento na Universidade de Auckland em 2021. Atualmente, ela é pesquisadora pós-doutoral no Instituto Oceanográfico Woods Hole, em Massachusetts.
Para a pesquisa, a equipe trabalhou com dez cações-pintados-de-estuário juvenis, sendo cinco machos e cinco fêmeas, que foram capturados na costa da Nova Zelândia. Os tubarões foram alojados em grandes tanques de laboratório, onde receberam condições adequadas de água do mar e alimentação, mantidos de maio de 2021 a abril de 2022. Para registrar os sons emitidos, os tubarões foram transferidos para tanques individuais equipados com microfones subaquáticos. Durante manuseio, os tubarões emitiam cliques semelhantes aos que Nieder tinha notado anteriormente.
Os cliques registrados eram extremamente curtos, com uma duração média de 48 milissegundos, e foram classificados como de banda larga, ocorrendo em frequências que variavam de 2,4 a 18,5 quilohertz, algumas das quais podem ser detectadas pelos seres humanos. Em termos de volume, os cliques atingiam aproximadamente 156 decibéis. O estudo revelou que a maioria dos cliques ocorria nos primeiros 10 segundos de manuseio, diminuindo com o tempo, levando Nieder a considerar que o comportamento poderia ser intencional e não acidental.
Além disso, cerca de 70% dos cliques aconteceram quando os tubarões se moviam lentamente de um lado para o outro, e 25% durante movimentos mais enérgicos. Apenas 5% dos cliques foram observados quando os tubarões estavam parados. Sem órgãos especializados para a produção de som, os pesquisadores acreditam que os cliques se originem do contato de seus dentes fortes e interligados. Os padrões de clique sugerem uma intenção por trás da produção sonora.
As causas exatas para a emissão dos cliques ainda estão sendo investigadas. Uma teoria sugere que os sons podem atuar como um sinal de estresse em resposta ao manuseio experimental. A maioria dos cliques estava fora do alcance auditivo dos próprios cações-pintados-de-estuário, limitados a cerca de 800 hertz. Isso levanta a possibilidade de que os sons possam servir como um mecanismo de alerta ou forma de agressão em situações envolvendo presas ou ameaças.
Embora existam mais de 500 espécies de tubarões, ainda não está claro se outras espécies possuem a capacidade de produzir sons como o cação-pintado-de-estuário. Pesquisadores expressam confiança de que suas descobertas possam contribuir para um melhor entendimento da ecologia e do comportamento de comunicação dos tubarões em seus habitats naturais. O estudo também abre espaço para futuras investigações sobre a produção sonora desses tubarões em ambientes naturais e as condições em que isso ocorre.